Ponte Nova - Terra de Minas


O Município de Ponte Nova localiza-se na Zona da Mata Norte de Minas Gerais. Possui uma área total de 471 km2. De topografia montanhosa, 402 metros de altitude e clima entre o temperado e tropical é atravessado pelos rios Piranga e Carmo que se unem para formar o Rio Doce que deságua no Atlântico.


Como integrante da Zona da Mata, a microrregião onde se situa Ponte Nova era também ocupada pela Mata Atlântica, que foi sendo devastada, embora ainda restem pequenas reservas. Como observa Magalhães (1922, p. 9), ainda em meados do século XVIII, a mata era ocupada pelos índios, entre eles os Aymorés e Purys que viviam nas áreas margeadas pelo rio Piranga A política de colonização dessas áreas foi um processo lento.

Mapa de Ponte Nova - início do Século XX

Para melhor compreender o atual quadro sócio-econômico do Município de Ponte Nova, algumas especificidades históricas da região se fazem necessárias, uma vez que a evolução da formação sócio-econômica do município está intimamente relacionada com o modelo de ocupação da Zona da Mata Mineira.


De acordo com Antônio Brant Ribeiro Filho (1993), com o declínio da mineração na região das minas, as matas vão sendo abertas, através de Sesmaria datada de 1755 a um Medeiros da Costa Camargo, que funda em 1756 a fazenda da Vargem Alegre, tornando-se comum o plantio da cana-de-açúcar. Daí surgem outras fazendas como a do Córrego das Almas sob a propriedade da mesma família. Em 1763, outro Monte de Medeiros, recém-ordenado padre, João do Monte de Medeiros, doa o terreno que lhe pertence e sob a autorização do Bispado de Mariana é erguida a capela de S. Sebastião das Almas de Ponte Nova. Ao redor da capela são construídas as primeiras casas.
Fazenda Vau-Açu

Aos poucos, outros colonizadores chegaram à região, formando propriedades agrícolas como a Fazenda Vilela legalizada pela Sesmaria de 1747 e a Fazenda do Sacramento, propriedade dos Martins da Silva, que posteriormente também estende os seus domínios até a “Quebra-Canoas” (RIBEIRO E FILHO, 1996, p. 26). A abertura de fazendas, a derrubada da mata e a produção de gêneros alimentícios exigiam mão-de-obra e em versos alexandrinos o poeta proprietário em seu resumo histórico de Ponte Nova, canta:
Ao machado em acção, matas virgens tombavam,
Derribadas, assim, nas fazendas se abriam,
Cafezaes, em seguida ás queimadas, nasciam
No terreno alinhado, onde os pés se plantavam
(MAGALHÂES, 1922, p. 9).


Fazenda Sacramento
ARQUIVO da FAMÍLIA MARTINS


Fazenda do Engenho





Fazendas conquistadas em regime de sesmarias, produto da escravidão
[1] e do tráfico interno que sustentaria a produção de açúcar e aguardente. Tráfico este denunciado em 1833, pelo governador da província de Ouro Preto, Antonio Limpo de Abreu ao juiz de paz de Ponte Nova, ordenando averiguar os escravos furtados da corte e ali vendidos (APM, SP, 1833-1834, p. 77).

Cessado o tráfico, a lavoura continuará apegada ao braço escravo e as estatísticas de 1874-75 acusam uma matrícula de 8.434 escravos no Município de Ponte Nova:


Reunida a junta classificadora de escravos, em casas de residência do presidente da mesma, Jose Maria da Silveira, e sob a presidência deste, continuou nos seus trabalhos de classificação e reunião do corrente anno, e tendo-se completado os trabalhos da mesma, verificou-se terem sido classificados no anno de 1874, 8.212 escravos, dos 8.434 matriculados neste Município, havendo fallecida deste ultimo a matricula, ate a data da classificação 144 escravos, e libertados por diversos títulos , 41, e que havia um excesso de numero, na matricula de 7 escravos por enganos na respectiva numeração . Na classificação feita no corrente anno, verificando-se terem sido classificados, 3 a 2 escravos, que vierao com seus Senhores, de diversas localidades, residem neste Municpio; e que dos classificados a anno passado, haviao fallecido, 131 escravos, e sido libertados por diversos títulos, 92 escravos; aquela o computo total, de 245 fallecidos, e 163 libertos, ficando a presente classificação com 8291 escravos classificados.
[2]

Conforme pode ser observado no texto anteriormente apresentado, em Ponte Nova, houve uma grande circulação de negros. Sob a presidência de José Maria da Silveira, em seus 146 dias de serviços a junta classificadora de escravos constata um total de 245 falecidos e 163 libertos, ficando classificados 8291 escravos e é no mesmo documento que aponta a interrupção dos trabalhos em virtude de um surto de varíola.


Temendo algum tipo de revolta os donos da terra cediam ou doavam aos seus fiéis escravos ou agregados algum título que possibilitasse a sua liberdade ou mesmo a posse de bens. É o que comprova o documento abaixo:

Pertence a Snra Maria Thereza Antonia de Jesus este título que fica pertencendo a dita Snra. Na minha falta e na falta della aifica com nossos escravos (dois nomes riscados, ilegível) tambem.


Sto Antonio 12 dezembro 1870, Francisco Lourenço Dias[3]

Com a morte de seus senhores, alguns escravos tinham a oportunidade de ficar com títulos e bens destes. Alguns chegaram a adquirir sua liberdade através das cartas de alforria, conforme farta documentação encontrada no Cartório do 1º Ofício de Ponte Nova.


No século XIX, ocorrem grandes transformações político-econômicas em Ponte Nova: elevação a categoria de freguesia (1832), Vila (1857), cidade (1866) e comarca (1875). O historiador Ângelo Carrara (1999, p. 26), observa que nessa época, o horizonte agrário da zona da Mata norte desenhava-se a partir da criação de porcos, lavouras de cana-de-açúcar e os grãos usuais (milho e feijão). Conseqüentemente, a paisagem vai sendo transformada, quando a partir de 1870, a fronteira do café chega ao norte da mata. A modernidade e o progresso dos trilhos[4] da Leopoldina Railway em 1866, facilitava os transportes e estimulava a indústria açucareira e cafeeira.

A população de Ponte Nova recenseada em 1890 revelava surpreendente crescimento, 41.103 habitantes, com “diversas artes e profissões”: exportadores de açúcar, café, aguardente, agrimensores, alugadores de pasto, ferreiros, fogueteiros, alfaiates, carpinteiros, fotógrafos, restaurantes, olarias, casas de pensão, bancos, tipografias, hotéis. Seus personagens percorriam ruas, praças, comércios, estações e fazendas. Muitos brasileiros mas também, “colonos syrios, italianos e portuguezes, dos quaes os syrios e os portuguezes dedicam-se com preferência ao commercio, e os italianos à agricultura, e, especialmente, ao cultivo do café” (CARVALHO, 1954, p. 10).


Com isso, também as Usinas funcionavam em ritmo do progresso como a Companhia Açucareira Vieira Martins, o Engenho Central de Piranga (em Chopotó), a Usina da Fazenda Vau-Açu. Geograficamente, sem dúvida, o município estava ligado a capital do império, Rio de Janeiro, recebendo em 1886 a visita do imperador Pedro II, “seria a apoteose de todo aquele momento histórico” (RIBEIRO FILHO, 1996, p. 52).


Na época, a esposa do então deputado provincial Antonio Martins, Sra. D. Maria Genoveva Martins, organiza uma liga abolicionista. A libertação dos escravos tinha como condicionante a prestação de serviço durante algum tempo, adotando o sistema de parceria agrícola com trabalhadores livres nacionais e colonos estrangeiros, na maior parte italianos que começavam a se localizar nas fazendas para a cultura do café (MAGALHÃES, 1922, p. 47).

No primeiro decênio do século 20, Ponte Nova, já figurava em segundo lugar entre os municípios de maior produção de café de Minas Gerais, sendo superado apenas pelo município de Muriaé, valendo-lhe o título de “princesinha da Zona da Mata”, a “rainha do açúcar e do café” (CARVALHO, 1954, pp. 31-59).

A cidade transforma, a antiga Fazenda das Palmeiras, exibe o requinte arquitetônico italiano da Escola Nossa Senhora Auxiliadora (1896) bem como às margens do Piranga, o Hotel Glória (1920), um dos símbolos da Béle Époque. A riqueza que por ali circulava, a modernidade e o progresso foi para poucos: a elite agrária do açúcar e do café.


Em 1930 ocorre uma crise nacional na cafeicultura. A superprodução de café no Brasil e a baixa do seu preço no mercado internacional conduzem à adoção de uma política de revalorização, centrada na destruição de estoques excedentes e na proibição do plantio de novos cafeeiros em todo país. A sobrevivência da Zona da Mata baseou-se, à época, na pecuária e na diversificação de produtos de subsistência, de acordo com o diagnóstico municipal de Ponte Nova (SEBRAE – MG, 2000).
Fazenda Quebra-Canoas

Esta crise exigiu que a elite agrária ponte-novense voltasse o olhar para as suas Usinas de Açúcar: Ana Florência, Jatiboca, no então distrito de Urucânia, a do Pontal, pioneira na produção de álcool anidro, São José, Santa Helena (fundada por iniciativa do ex-presidente Arthur Bernardes em 1939, na Fazenda Vau-Açu e encerrada em 1972); Destilaria Leonardo Truda, projetada pelo Instituto do Açúcar e do Álcool, cuja construção foi se arrastando desde os anos 40, sendo concluída apenas em 1954.


Nota-se que ocorre intensa evasão populacional entre 1960 e 1980, principalmente do meio rural, em decorrência da estagnação econômica da região, direcionada ao Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte e, em menor escala, aos centros regionais, como Juiz de Fora. Assim, em 1950 a população total era de 36.513 (a urbana de 16.309 ; e a rural 20.204) habitantes; hoje consta de 55. 303 habitantes, dos quais 6. 305 residentes nas áreas rurais e 48. 997 na sede do município (IBGE, 2000).

Estima-se a existência de 4 000 a 6 000 empregos na região, ligados ao cultivo de cana, demonstrando ainda a forte influência com base na relação de um trabalhador para cada três hectares plantados. A Cooperativa Regional Mista dos Plantadores de Cana (COPLACAN, 1943), a Associação dos Plantadores de Cana de Minas Gerais (MINASCANA, 1962) e a Cooperativa de Crédito Rural dos Plantadores de Cana da Zona da Mata COPERCREDI são instituições atuantes no setor canavieiro (SEBRAE- MG, 2000).

Em março de 2000 entrou em operação o Frigorífico Regional do Vale do Piranga – FRIVAP, detentor da marca SAUDALI, presença de suinocultura forte no entorno municipal, com processamento agroindustrial de porte expressivo, atendendo aos mercados regional e nacional, aumentando a possibilidade de novos empregos para uma população de 55.958 habitantes (IBGE, 2010).

Saudali - Ponte Nova

De modo geral, a maior proporção de população dispõe de até um salário-mínimo mensal, o que abrange 69,4% das famílias. No outro extremo, o município ostenta menor participação de famílias nos segmentos de renda média mensal superiores a cinco salários-mínimos (idem, SEBRAE, 2000).


A estrutura fundiária do município evidencia o predomínio de pequenas e médias propriedades, na maioria dos casos ainda sob domínio dos descendentes dos sesmeiros, determinando a hierarquia branca sobre uma população de negros, mestiços e italianos pobres que lutam por conservarem seu “quinhão” e semanalmente percorrem as estradas que os levam até a cidade.

Assim, quem passar por esta cidade histórica, “terra de minas”, perceberá que ela é integrante de uma dinâmica cultural que se constrói no tempo e se manifesta no espaço; expressando identidades múltiplas e dinâmicas, envolta nas sutilezas sincréticas do repique dos sinos de “São Sebastião”, “Rosário”, “São Pedro”, “Nossa Senhora Auxiliadora” e outras.

Ana Luiza Fernandes de Oliveira Dias - Especialista em História, MS em Economia Doméstica
Perdão e Axé no Rosário do Pontal - Ponte Nova/2009

                                              Festa de Nossa Senhora Auxiliadora -
                                              ARQUIVO MUSEU CEM ANOS AUXILIADORA - Escola N.S. Auxiliadora


                                                    MATRIZ SÃO SEBASTIÃO - PONTE NOVA - MG

Em seus versos a poetisa Laene Teixeira Mucci vive a Cidade com a sua história, mística e encantos.
http://www.pontenet.com.br/principal/principal/frame.php


[1]
É interessante citar uma nota reproduzida na tese de mestrado de Irene Nogueira de Rezende (2004, p. 59), O Paraíso e a Esperança - vida cotidiana de fazendeiros na Zona da Mata de Minas Gerais (1889-1930), onde os mesmos contavam com a oferta de mão-de-obra escrava: “A população escrava de Minas Gerais expandia-se vigorosamente, passando de 170 mil em 1819 para 380 mil em 1873, tendo Minas sozinha, fora da grande lavoura de exportação e da mineração, mais escravos que qualquer outra sociedade escravista da América Latina, com exceção de São Domingos e Cuba em seus dias de glória” (ARRUDA, 1990, p. 143).

[2]
ARQUIVO Público Mineiro/ Seção Provincial (1390). Classificação de escravos do município de Ponte Nova: 1874-187, pp. 134-135.

[3] ARQUIVO da família MESSIAS PINTO.

[4] Segundo Peter Blasenhein, “As exportações de café quase dobraram entre 1875 e 1880, um aumento que os fazendeiros atribuíam à locomotiva. A maioria das ferrovias da Mata foram construídas com capital particular, mas o governo provincial estimulou o crescimento garantindo aos investidores um retorno de 7% no seu capital ou concedendo subsídios a companhias baseados em quilometragem (BLASENHEIN, 1982, pp. 26-27).

Comentários

  1. Há um periodo entre 1840 até mais ou menos 1890, na historia de quebra canoas que não é relatado em nenhuma parte das historia.... Gostaria muito de saber....Meu email: whcp1953@yahoo.com.br

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

As bolsas de mandinga

Alinhamento dos Chacras com o Pai Nosso

Fonseca - uma história de emoções