Conjuração Baiana e Inconfidência Mineria

Não eram os norte-americanos que serviam de exemplo a João de Deus e aos seus companheiros envolvidos na Conspiração em Salvador (Bahia). Eram os sans-culottes. A 12 de agosto de 1798, apareceram por toda a cidade manifestos manuscritos, dirigidos ao povo da Bahia.
Aviso ao Povo Bahiense
Ó vós Povo que nascesteis para sereis livres e para gozares dos bons efeitos da Liberdade, ó vós
Povos que viveis flagelados com o pleno poder do indigno coroado, esse mesmo rei que vós criastes;
esse mesmo rei tirano é quem se firma no trono para vos veixar, para vos roubar e para vos maltratar.
Homens, o tempo é chegado para a vossa ressurreição, sim para ressuscitares do abismo da escravidão,
para levantareis a sagrada Bandeira da Liberdade. [...]
As nações do mundo todas têm seus olhos fixos na França, a liberdade é agradável para todos; [...] o dia da nossa revolução; da nossa Liberdade e de nossa felicidade está para chegar, animai-vos que sereis felizes.
(Trechos do panfleto revolucionário afixado nas ruas de Salvador na manhã de 12 de agosto de 1798. In: PRIORE, Mary Del et al. Documentos de História do Brasil: de Cabral aos anos 90. São Paulo: Scipione, 1997.)
                                   O Pelourinho, em Salvador, foi cenário dos trágicos       
                                 acontecimentos da Conjuração Baiana.



Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão
França, 26 de agosto de 1789.
Os representantes do povo francês, reunidos em Assembléia Nacional, tendo em vista que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção dos Governos, resolveram declarar solenemente os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, a fim de que esta declaração, sempre presente em todos os membros do corpo social, lhes lembre permanentemente seus direitos e seus deveres; a fim de que os atos do Poder Legislativo e do Poder Executivo, podendo ser a qualquer momento comparados com a finalidade de toda a instituição política, sejam por isso mais respeitados; a fim de que as reivindicações dos cidadãos, doravante fundadas em princípios simples e incontestáveis, se dirijam sempre à conservação da Constituição e à felicidade geral.
Em razão disto, a Assembléia Nacional reconhece e declara, na presença e sob a égide do Ser Supremo, os seguintes direitos do homem e do cidadão:
Art.1º. Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem fundamentar-se na utilidade comum.
Art. 2º. A finalidade de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem. Esses direitos são a liberdade, a prosperidade, a segurança e a resistência à opressão.
Art. 3º. O princípio de toda a soberania reside, essencialmente, na nação. Nenhuma operação, nenhum indivíduo pode exercer autoridade que dela não emane expressamente.
Art. 4º. A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo. Assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei.
Art. 5º. A lei não proíbe senão as ações nocivas à sociedade. Tudo que não é vedado pela lei não pode ser obstado e ninguémpode ser constrangido a fazer o que ela não ordene.
Art. 6º. A lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou através de mandatários, para a sua formação. Ela deve ser a mesma para todos, seja para proteger, seja para punir. Todos os cidadãos são iguais a seus olhos e igualmente admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos públicos, segundo a sua capacidade e sem outra distinçãoque não seja a das suas virtudes e dos seus talentos.
Art. 7º. Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela lei e de acordo com as formas por esta prescritas. Os que solicitam, expedem, executam ou mandam executar ordens arbitrárias devem ser punidos; mas qualquer cidadão convocado ou detido em virtude da lei deve obedecer imediatamente, caso contrário torna-se culpado de resistência.
Art. 8º. A lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias e ninguém pode ser punido senão por força de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada.
Art. 9º. Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei.
Art. 10º. Ninguém pode ser molestado por suas opiniões, incluindo opiniões religiosas, desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela lei.
Art. 11º. A livre comunicação das idéias e das opiniões é um dos mais preciosos direitos do homem. Todo cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente, respondendo, todavia, pelos abusos desta liberdade nos termos previstos na lei.
Art. 12º. A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública. Esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada.
Art. 13º. Para a manutenção da força pública e para as despesas de administração é indispensável uma contribuição comum que deve ser dividida entre os cidadãos de acordo com suas possibilidades.
Art. 14º. Todos os cidadãos têm direito de verificar, por si ou pelos seus representantes, da necessidade da contribuição pública, de consenti-la livremente, de observar o seu emprego e de lhe fixar a repartição, a coleta, a cobrança e a duração.
Art. 15º. A sociedade tem o direito de pedir contas a todo agente público pela sua administração.
Art. 16.º A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição.
Art. 17.º Como a propriedade é um direito inviolável e sagrado, ninguém dela pode ser privado, a não ser quando a necessidade pública legalmente comprovada o exigir e sob condição de justa e prévia indenização.
(In Textos Básicos sobre Derechos Humanos. Madrid. Universidad Complutense, 1973, traduzido do espanhol por Marcus Cláudio Acqua Viva. APUD FERREIRA Filho, Manoel G. et. alli. Liberdades Públicas
São Paulo, Ed. Saraiva, 1978.
)
  •  Fazer um resumo/lista das reivindicações do Manifesto ao Povo Bahienense e depois confronta-lo com a Declaração dos Direitos, estabelecendo relação entre cada uma das reivindicações com um artigo da Declaração. 

Leia e interprete os trechos:
Texto 1:
Da acareação, por nós pausada e refletidamente feita, de todos os depoimentos, resulta que, verdadeiramente, entre os vários que se conluiaram, só um chegou a entusiasmar-se pela idéia da revolução: foi o mencionado Joaquim José da Silva Xavier. A esse único pensamento subordinava tudo quanto via e ouvia; e com leviandade e audácia inaudita, a todos se propunha converter e angariar, inclusivamente inventando que havia esperanças de socorros estrangeiros; foi ele que atrevidamente começou por abordar o seu próprio comandante; foi ele que inutilmente tentou aliciar a Cláudio Manuel da Costa; e depois abordava cada qual pelo seu respectivo lado falso. No auge do entusiasmo, obedecia não só os impulsos do patriotismo, como aos da ambição. Havendo começado por aplicar-se à profissão de dentista, chegou a ser hábil; depois lançou-se também a mascatear em Minas Novas, mas saiu-se mal; pretendeu votar-se à mineração, mas saiu-se de novo mal. Cumpre acrescentar que para alguns dos malogros do mesmo alferes em suas pretensões, além da circunstância de ser Tiradentes, devia também contribuir o seu físico. Era bastante alto e muito espadaúdo, de figura antipático, feio e espantado. O martírio do patíbulo conferiu ao alferes Silva Xavier, apesar de pobre, sem respeito e louco, a glória toda de semelhante aspiração prematura em favor da independência do Brasil. (Texto adaptado)
VARNHAGEN, Francisco Adolfo de. História geral do Brasil. 10 ed. São Paulo: Melhoramentos, 1978 (1854/1877). p. 311-322.
Texto 2:
Os elementos com que ia agir a revolução não podiam ser mais dignos. O número considerável de poetas que figuram entre os chefes da conspiração dá-lhes um certo caráter de elevação intelectual e teórica; tão altos exemplos nunca desaparecem sem deixar um grande ensinamento e pode-se dizer que desde a conjuração de Minas nenhum homem intelectual do Brasil poderia estar jamais obrigado à lealdade a Portugal. A alma da propaganda dos conspiradores era o alferes Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha Tiradentes, homem de espírito religioso, de grande coragem e de nobilíssimo caráter, mas o mais indiscreto de todos. Tiradentes foi preso e, com ele, sucessivamente os outros conspiradores, por onde eram encontrados. Quase todos se arrependeram amargamente do passo que haviam dado; Tiradentes, conforme o seu coração bem formado e leal, dizia que só ele em verdade devia ser a vítima da lei e que morria jubiloso por não levar após si tantos infelizes; ele era um espírito grandemente forte e na religião achou mais largo e substancioso conforto do que os outros companheiros de espírito leviano ou inconsiderado. Ele subiu rapidamente os degraus do tablado onde seria enforcado, sempre com os olhos fixos no Crucifixo que trazia e pediu ao carrasco que abreviasse o suplício. (Texto adaptado).
RIBEIRO, João. História do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia, 2001 (1900), p. 197-208.

SUGESTÃO DE ATIVIDADES
  • Caracterizar a opinião de cada autor sobre o caráter e o papel de Tiradentes na Conjuração de Minas. Socializar os resultados.
  • Localizar e caracterizar a época em que cada documento foi escrito.
  • Identificar um ponto de identidade e um ponto de divergência entre as Conjurações Baiana e Mineira. 


Glossário:

Sans-culottes: Esse termo é empregado, durante o período revolucionário, sobretudo a partir de 1792, para designar as massas populares urbanas, de Paris. Politicamente, os sans-culottes formam a armadura das seções parisienses e dos comitês revolucionários, o setor mais radical da Revolução. Socialmente, os sans-culottes representam citadinos que vivem de seu trabalho, seja como artesãos, seja como profissionais de ofícios; alguns, depois de uma vida laboriosa, se tornam pequenos proprietários na cidade, e usufruem as rendas de um imóvel. Portanto, o sans-culotte não deve ser confundido com o indigente que ele quer socorrer. Este grupo de pequenos proprietários pensa que a difusão da propriedade permitirá a instauração da felicidade, graças à igualdade. Consumidores urbanos, os sans-culottes são sensíveis às dificuldades de abastecimento, às crises de víveres (...) Eles exigem a taxação dos gêneros. Ë preciso fixar invariavelmente os preços dos gêneros de primeira necessidade, os salários do trabalho, os lucros da empresa e os ganhos do comércio. O programa econômico dos sans-culottes permanece vago e surge como uma aspiração à igualdade entre pequenos proprietários independentes, possuindo meios de satisfazer às suas necessidades. Os sans-culottes se reconhecem exatamente pela prática das virtudes republicanas e da igualdade: dirigem-se aos outros chamando-os de cidadãos e cidadãs (...). Sua aparência é popular: usam calça, vestimenta de trabalho, e não calção, roupa de ostentação do aristocrata, uma camisa, uma jaqueta curta, a carmanhola; usam o barrete frígio, símbolo antigo da escravidão libertada, marcado pela insígnia nacional; usam permanentemente o sabre e o pique, porque só o homem armado pode defender a Revolução.
(PÉRONNET, Michel. Revolução Francesa em 50 Palavras-Chaves. São Paulo: Brasiliense, 1988, pp.248-50, adaptado).

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