Terceiro Setor


Texto 1


O Terceiro Setor é assim chamado porque engloba instituições com fins públicos, porém de caráter privado, que não se enquadram, portanto no Primeiro Setor (Estado). São regidas pelo direito privado, mas não possuem objetivos mercantis, também não sendo qualificadas como instituições do Segundo Setor (Mercado). Fazem parte do denominado espaço público não estatal.

Qualificam-se como entidades do Terceiro Setor as ONGs, associações, fundações, entidades de assistência social, educação, saúde, esporte, meio ambiente, cultura, ciência e tecnologia, entre outras várias organizações da sociedade civil.
O Terceiro Setor abrange ações públicas que saem do domínio estatal, e passam a ser encampadas por organizações da sociedade civil. É o surgimento da iniciativa privada com fins públicos, com o objetivo de combater grandes problemas do mundo atual, como a pobreza, violência, poluição, analfabetismo, racismo, etc. São instituições com grande potencial de representatividade, podendo ser vistas como legítimas representantes dos interesses da sociedade civil.
Dentre as razões que levaram ao crescimento mundial do Terceiro Setor, encontram-se a pouca representatividade, a capacidade limitada na execução de tarefas sociais, e a falta de capilaridade por parte de órgãos governamentais, características necessárias à execução de determinadas ações, e tão típicas das modernas ONGs. Além disso, estes órgãos do governo têm dificuldade na manutenção de programas já implementados, e uma morosidade no repasse de recursos que torna certas ações inviáveis.
É notório que ações públicas são comprovadamente mais eficazes se realizadas em parceria, e ações conjuntas entre o governo e organizações da sociedade civil fazem parte da política global de descentralização, citada em nossa Constituição Federal (capítulo 3, seções A e C).
As organizações da sociedade civil acumulam infra-estrutura, conhecimentos, recursos humanos de qualidade, experiência, e estão perfeitamente aptas a trabalhar em parceria com órgãos públicos.
O crescimento do Terceiro Setor denota um aumento do compromisso da sociedade com a cidadania, e o produto das organizações da sociedade civil é um ser humano mudado, consciente de suas responsabilidades como cidadão global.
Terceiro Setor
Texto 2
'ONG’, no Brasil, é uma palavra que veio a ser utilizada nos anos 80 para caracterizar um determinado tipo de entidades - ditas 'de assessoria e apoio' ou 'a serviço dos grupos e movimentos populares' - que, de modo quase invisível, havia começado a atuar 'de costas para o Estado' e 'nas bases da sociedade' durante o regime autoritário. O fenômeno precede o nome na medida em que, pelo menos até meados dos anos 80, uma ONG não nascia pronta e acabada. Do ponto de vista da história contada por seus protagonistas, 'assessorias', 'projetos', 'centros' é que, gradualmente, foram se consolidando até 'virar ONGs'. De um ponto de vista retrospectivo mais amplo, o surgimento e multiplicação das ONGs constitui, por um lado, uma vertente significativa do processo de auto-estruturação de uma sociedade civil no contexto da luta pelo restabelecimento do Estado de Direito e, por outro lado, representa a emergência de um tipo específico de organização, marcada por um forte viés anti-Estado e cuja evolução vai configurar um sub-conjunto bem delineado no interior do campo mais amplo das entidades sem fins lucrativos.
Em seu estudo pioneiro, significativamente intitulado “A Invenção das ONGs: do serviço invisível à profissão sem nome” – Leilah Landim argumenta que a gênese do que viriam a ser as ONGs brasileiras se confunde com a história da chamada 'educação popular'. Os personagens fundadores deste novo tipo de organização são os 'educadores de base', ou seja, professores, religiosos, trabalhadores sociais que, em sua grande maioria, haviam participado antes de 1964 dos programas de alfabetização de adultos inspirados por Paulo Freire, dos movimentos de cultura popular promovidos por organizações estudantis e governos estaduais como o de Miguel Arraes em Pernambuco bem como dos projetos de educação e desenvolvimento comunitário apoiados pela Igreja Católica
Com o apoio e a proteção da Igreja, o trabalho popular de 'assessores' e 'agentes' vai construindo uma rede invisível de conhecimentos e solidariedades e vai formando uma nova geração de líderes comunitários e futuros dirigentes de movimentos sociais. Revalorizam-se as relações inter-pessoais e as redes informais para o enfrentamento dos problemas quotidianos, promove-se a ajuda mútua e a solidariedade, entende-se que 'consciência é libertação'. Neste processo, os 'cursos' e 'assessorias' episódicos dão lugar a 'projetos' mais duradouros, financiados sobretudo por agências privadas internacionais, para a execução dos quais torna-se necessária a constituição de instituições dotadas de personalidade jurídica. Surgem os 'Centros' e 'Institutos' de educação e promoção popular, precursores de algumas das principais ONGs brasileiras.
[...]
De fato, a tomada de consciência pelas próprias ONGs de sua originalidade e especificidade é um fenômeno dos anos 80. Ao longo de toda a década de 70, as proto-ONGs definiam-se radicalmente como estando 'a serviço' das necessidades e interesses dos setores dominados da população. Por não existirem para si, por não fazerem sentido em si mesmas não tinham compromissos com sua própria permanência. Viam-se como instrumentos transitórios, que respondiam a uma necessidade percebida como conjuntural. Desprovidos de legitimidade própria, perderiam provavelmente sua razão de ser quando os movimentos populares, estes sim os autênticos sujeitos coletivos do processo de transformação da sociedade, conquistassem sua plena liberdade e autonomia. Por estas razões, a invisibilidade não lhes incomodava. Além de uma virtude, representava também uma certa proteção frente ao risco sempre presente de repressão pelo Estado autoritário.
Ao enfatizar o envolvimento direto da população no enfrentamento dos problemas e carências que afetam a vida quotidiana e ao enfatizar a reivindicação de direitos pelos mais diferentes grupos sociais, as ações das ONGs dispersam-se por um sem número de temáticas, lugares e circunstâncias. Neste sentido, antecipam a agenda de novos movimentos populares bem como a explosão de demandas e conflitos de interesse que vai caracterizar o Brasil enquanto sociedade democrática de massas nos anos 80 e 90. Ao promover a mobilização de recursos, competências e poderes nos níveis inferiores da estrutura política e social, as ONGs também antecipam a noção que, em sociedades complexas, democracia, cidadania e processos de mudança social se estruturam a partir de uma multiplicidade de espaços, temas, práticas sociais e não só em função do poder de Estado ou da oposição entre capital e trabalho.
[...]
Esta entrada em cena de novos atores e temáticas, combinada às transformações profundas do relacionamento entre Estado e sociedade à medida que avança o processo de redemocratização, configura um marco de referência bem mais desafiador para a ação das ONGs do que a oposição radical entre 'organização popular na base' e 'Estado autoritário'. Neste sentido, a década de 80 será marcada pela interação entre dois fenômenos: um processo gradual de diferenciação entre ONGs e setores populares, com a conseqüente afirmação de um sentido próprio de identidade deste conjunto de organizações, e a experimentação de padrões de relacionamento mais flexíveis, de conflito e colaboração, entre ONGs e órgãos públicos.
(Oliveira, Miguel Darcy de.ONGs, sociedade civil e terceiro setor em seu relacionamento com o Estado no Sociedade Civil e Terceiro Setor)

Texto 3
O repúdio à forma instituída de prática política, encarada como manipulação, teve por contrapartida a vontade de 'serem sujeitos de sua própria história', tomando nas mãos as decisões que afetam as suas condições de existência. Com isso acabaram alargando a própria noção de política, pois politizaram múltiplas esferas do seu cotidiano.
(Sader, Eder. Quando novos personagens entraram em cena: experiências, falas e lutas dos trabalhadores da Grande São Paulo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.Citado em Silva, Carmen S. M.Identidade das ONGs e campo político dos movimentos sociais).
Texto 4
O grande desafio que se coloca hoje é de como coordenar o compromisso ético do atendimento aos mais pobres com o compromisso político de superar as causas da produção da pobreza. Aí o problema torna-se mais complexo, mais agudo e de difícil solução. Aí os consensos se vão.
(HADDAD, Sérgio. Ação Social no Novo Milênio. São Paulo, internet, 2001. Citado em Silva, Carmen S. M.Identidade das ONGs e campo político dos movimentos sociais)
Texto 5
A noção de Terceiro Setor, que vem se estabelecendo no cenário político, como um diferencial em relação ao Estado e ao mercado, nos parece insuficiente para a compreensão deste quadro. Este termo pretende englobar todas as sociedades civis sem fins lucrativos, desde as antigas entidades assistenciais e filantrópicas até as novas fundações empresariais, passando pelas Organizações Não Governamentais e as entidades organizadas a partir de Movimentos Sociais, que, por ventura, executem programas sociais. Ao aglutinar toda esta gama de experiências diversificadas, a noção de Terceiro Setor não ajuda a distinguir as especificidades de cada tipo de Organização e, de certa forma, acaba por encobrir as contradições existentes neste cenário. Por exemplo, encobre as contradições das empresas que possuem fundações e/ou setores de responsabilidade social, e que o fazem mantendo a exploração da mão-de-obra e a transferência de recursos dos seus impostos para o assistencialismo. Encobre também os diversos tipos de “associações civis sem fins lucrativos” e, com isso, reduz a legitimidade do discurso público das ONGs, e da Abong, fundado nos ideais de justiça e democracia, ou confere legitimidade a grandes empreendimentos que se camuflam como organizações filantrópicas, isto pra não falar em todas as possibilidades de corrupção ai existentes.
Do ponto de vista político-ideológico o neoliberalismo deslegitima as organizações populares e mobiliza a opinião pública contra as suas posições. Do ponto de vista prático trata a questão social como um problema de caridade e filantropia. A chamada filantropização da pobreza implica em transferir as responsabilidades que eram assumidas pelo Estado, ainda que de forma precária, para a sociedade. As fundações empresariais assumem o “papel social” das empresas, substituindo as políticas sociais universais inexistentes, e subtraindo dos cofres públicos o devido Imposto de Renda. Para buscar sua legitimação social estas organizações buscam construir uma imagem à semelhança das ONGs que lutam por democracia e justiça social, e lhes incorporam inúmeros instrumentos de linguagem e de práticas, que tornam cada vez mais difícil a diferenciação.
As ONGs, oriundas do período da redemocratização, buscam se legitimar como organizações de natureza pública, porém não governamental, e reivindicam o acesso aos fundos públicos, pelos serviços que prestam à sociedade brasileira. A diferença entre estas e aquelas está na ênfase entre prestar assistência ou organizar a luta por direitos, e também na leitura da realidade brasileira, o que inclui o posicionamento político sobre as causas estruturadoras da situação de pobreza e opressão.
(Silva, Carmen S. M.Identidade das ONGs e campo político dos movimentos sociais
A partir da leitura dos textos acima, coloque as seguintes questões:
1 – Identificar a conjuntura em que se deu o aparecimento das novas organizações da sociedade civil no Brasil, as chamadas “proto-ongs”.
2 – O “terceiro setor”, as ONGs nele incluídas, é um fenômeno mundial. Procure identificar as razões de seu surgimento e relacioná-las com o predomínio da política neoliberal nos países capitalistas.
3 – Um dos textos diferencia os tipos de entidades que compõem o “terceiro setor”. Identifique os tipos e diferenças apontadas.
4 – Identifique a diferença de concepção de fundo que separa as entidades do “terceiro setor” em dois blocos.
5 – O surgimento – e crescimento – do “terceiro setor” significa um alargamento da noção de política. Justifique.

Glossário:  
Sociedade civil: é a esfera das relações entre indivíduos, entre grupos e entre classes sociais que se desenvolvem fora das relações de poder que caracterizam as instituições estatais. De outro modo, é o campo ou o lugar onde se dão as várias formas de mobilização, de associação e de organização das forças sociais, que não são promovidas pelo Estado. (Adaptado de Bobbio, Norberto. Verbete “Sociedad civil”. Bobbio, Matteucci & Pasquino (org.) Diccionario de Política. 8ª. ed. Madrid: Siglo Veintiuno Editores, 1995, vol. 2, p. 1523)  
Conjuntura: conjunto de fatos ou circunstâncias em um dado momento; conjunto de elementos que compõem a situação política, econômica, social e cultural de um país, em um dado momento. Filantropia: “amizade à humanidade”; caridade.
Capilaridade: que tem penetração em toda a sociedade. Proto-ONGs: as primeiras ONGs; organizações que deram origem às ONGs atuais.
 Abong: Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais.

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