Da Fazenda das Palmeiras ao colégio de "educação das meninas"

Na sala da antiga Fazenda das Palmeiras, em Ponte Nova, segundo a memória das alunas:
Cessaram, como por encanto, o ruido do moinho, o vae-vem dos colonos, o canto magoado do escravo, para dar logar ás notas que se desprendem do piano, ao vae-vem de centenas de meninas cheias de brio e de vida, ao canto harmonioso e terno que se eleva ao pé do Sacrario e perde-se lá muito longe, depois de ter repercutido nas verdejantes collinas; as illustres Filhas do immortal D. Bosco, vão desvelando os segredos das linguas, das sciencias e das artes.

Da Fazenda das Palmeiras ao
"colégio de educação das meninas"

Correspondendo aos anseios do bispo salesiano, Dom Luis Lasagna, do vigário João Paulo Maria de Brito e da sociedade ponte-novense, em 4 de abril de 1895, o Agente Executivo de Ponte Nova, Dr. José Marianno Duarte Lanna, em mensagem a Câmara Municipal considera de utilidade municipal os terrenos e aguadas da Fazenda das Palmeiras, realizando "a compra dos 54 alqueires de terras, aguas e fontes nas vertentes do Corrego "Passa Cinco" e bem assim a casa de vivenda, pomar, paredão e ponte de pedra e um dos moinhos (...) fazendo declarar na escriptura que a casa de vivenda era destinada para o Collegio Saleziano.."[1]

A mensagem do Agente Executivo teve aprovação unânime da Câmara Municipal. transferindo através de doação, para a congregação dos Salesianos, o título de justos domínios das benfeitorias e terrenos para a fundação do colégio de educação de meninas.[2] Inicia-se a construção da Escola Nossa Senhora Auxiliadora que nasceu juntamente com o promissor bairro de Palmeiras.

Na memória das alunas, ficaram muitas lembranças como revela Maria Elisa Lanna:


(...) Os altos penachos das palmeiras viram operar-se a seus pés uma mysteriosa metamorphose: a casa completamente transformada, a monotomia da vida campestre substituida por uma vida cheia de actividade material e intelectual. Cessaram, como por encanto, o ruido do moinho, o vae-vem dos colonos, o canto magoado do escravo, para dar logar ás notas que se desprendem do piano, ao vae-vem de centenas de meninas cheias de brio e de vida, ao canto harmonioso e terno que se eleva ao pé do Sacrario e perde-se lá muito longe, depois de ter repercutido nas verdejantes collinas; e emquanto que, na sala da antiga fazenda, as illustres Filhas do immortal D. Bosco, vão desvelando os segredos das linguas, das sciencias e das artes, vão rasgando os densos véos que cobrem a intelligencia de suas discipulas, apontando-lhes o caminho, não somente da vida do lar domestico, mas tambem o caminho de um verdadeiro sacerdocio do magisterio (...)[1]
O curioso, entretanto, é perceber através deste relato a presença de várias identidades que circulavam por estas terras: a do escravo, a do colono e as italianas, filhas de D. Bosco. Um dos grandes desafios era, então, construir uma educação que mesmo sendo para as elites culturais pudesse acolher as diversas manifestações populares. Desafios enfrentados pelas primeiras educadoras desta escola: Irmã Martha Lusso (Português); da Irmã Diretora Maria Cleophas (Pedagogia); Irmã Josephina Martinoja (Geometria), Irmã Sidnéia d'Oliveira (História), Irmã Domingas Odone (Zoologia e Botânica); Irmã Carmelita Allegra (Caligrafia) e Rvda. Irmã Calota Rena (Trabalhos manuais).

É incontestável que, com a doação municipal da Fazenda das Palmeiras o perfil do local muda radicalmente: loteamento nos arredores, construções, transportes, povoamento, canalização das águas ...

O engenheiro responsável pela medição das terras da Fazenda das Palmeiras, Dr. Ernesto Rodocanachi, solicita à Câmara Municipal, em 1895, autorização para organizar uma S. A. sob a denominação de "Emprego Industrial de Melhoramentos de Ponte Nova", objetivando construir uma linha de carros de ferro de tração animal ou a vapor, para a condução de passagem de mercadorias entre esta cidade e a nova povoação a ser edificada nos terrenos ultimamente comprados pela Câmara Municipal.[2]

Da Fazenda ao Bairro das Palmeiras, robustecendo-se com a praça, arruamentos, transportes, conforme revela o jornal O Município:

Consta que um grupo de distintos cavalheiros de nossa cidade está organisando uma sociedade em comandita por acções para a construção de uma linha de bonds, ligando nossa cidade ás Palmeiras (...) É um melhoramento que vai dar enormíssimo impulso ao progresso de nossa cidade, facilitando o transporte daqui para as Palmeiras que é, por enquanto deficientíssimo, mesmo porque a Leopoldina só nos fornece passagem para alli nos trens de Rio Casca, o que deixa ainda muito a desejar.[3]

A transformação material e intelectual do bairro passa a ser notificada e neste mesmo ano de 1914, o jornal o Olho, noticia:

O Bairro de Palmeiras, cuja população é pouco inferior à da parte antiga desta cidade, devia merecer dos poderes publicos federal, municipal e estadoal um pouco mais de attenção (....) Em qualquer logar onde tem chegado o nome de nossa cidade e onde há alguem que nos tenha visitado, Palmeiras é sempre lembrada como um bairro digno de melhor sorte, quer pela sua admirável topographia, quer pelo rapido desenvolvimento que se operou e que se opera no povoado, quer pelas suas industrias nascentes, promissoras de um brilhante futuro, pelo seu modelar estabelecimento de ensino (...). De há muito a população deste bairro reclama para aqui um carteiro e uma caixa postal, afim de que sejam facilitados o recebimento e o transporte diários das suas correspondências, daqui a Agencia do Correio, separada deste bairro quasi 3 kilometros (...)[1]

Com o número crescente de habitantes e variedade de suas demandas aumenta gradativamente a pressão sobre as autoridades:

Vários moradores do Largo das Palmeiras queixam-se de uma irregularidade que alli vivem e por lá transitam, e occulta, unicamente aos olhos do Snr. Delegado de hygiene e do digno fiscal da municipalidade. Há no referido Largo um Corrego que o contorna, passando quasi unido aos muros do Collegio Maria Auxiliadora. Esse corrego, que corta a principal praça do nosso bairro deve estar sempre limpo, para que suas aguas tenham livre curso e não se estagnem, como acontece agora, sujeitas a prejudicar a saude publica com os miasmas que dellas, com certeza, deverão se desprender (...)[2]

Evidentemente, o bairro de Palmeiras, tornaria-se mais bem visto freqüentado com um jardim que recebeu o incentivo da Escola Nossa Senhora Auxiliadora:

Perante numerosa assistencia, realisou-se em Palmeiras, no edificio da Escolal Normal N. S. Auxiliadora, o festival em beneficio da construção do jardim. O desempenho das peças representadas causou a melhor impressão, sendo as alunnas da Escola muito applaudidas.
A banda ceciliana compareceu á festa.[3]

O bairro cresceu e desenvolveu. Dessa maneira, quem passar por este bairro , "terra perceberá que a Escola Nossa Senhora Auxiliadora é integrante de uma dinâmica cultural que se constrói no tempo e se manifesta no espaço, expressando a pedagogia de D. Bosco e sempre mantendo os olhos para o futuro.










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[1] ARQUIVO MUNICIPAL de Ponte Nova. Ata extraordinária da Câmara Municipal, 5 de abril de 1895, pp. 150-56.

[2] Cf. Ata da 1ª reunião ordinária da Camara Municipal de Ponte Nova, ano de 1895, pp. 156-59. Grifos nossos.

[1] Discurso proferido pela Quartanista D. Maria Elisa Lanna, Annuario da Escola Normal "N. S. Auxiliadora" em Ponte Nova (Minas Gerais). Anno Lectivo de 1905. São Paulo. Escolas Profissionais Salesianas, 1905, pp. 5-6.

[2] ARQUIVO Municipal de Ponte Nova. Ata da 1ª reunião da 2ª sessão ordinária da Câmara Municipal de Ponte Nova, no ano de 1895, pp. 156-159.

[3] O MUNICÍPIO, Ponte Nova, 30 de julho de 1914.

[1] O OLHO, N. 9, Ponte Nova (Palmeiras), 29 de novembro de 1914. Trim. 1. Os grifos são meus.

[1] Idem. 25 de outubro de 1914.

[1] CORREIO DA SEMANA, 1920, Ponte Nova. Nº 335.

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