A condição humana






*Hannah Arendt, filósofa e pensadora política, nasceu na Alemanha em 1906 e faleceu em 1975.


 O seu crescente envolvimento com o sionismo levá-la-ia a colidir com o anti-semitismo do Terceiro Reich o que a conduziria, seguramente, à prisão. Conseguiu escapar da Alemanha e passou por Praga e GenebraParis, onde trabalhou pelos 6 anos seguintes com crianças judias expatriadas e conheceu e tornou-se amiga do crítico literário e filósofo marxista Walter Benjamin. Foi presa (uma segunda vez) na França conjuntamente com o marido, o operário e "marxista crítico" Heinrich Blutcher, e acabaria em 1941 por partir para os Estados Unidos, com a ajuda do jornalista americano Varian Fry.



Conhecida como uma pensadora da liberdade, articula reflexões existenciais com questões políticas. Esse é seu livro A CONDIÇÃO HUMANA, mais citado e referenciado, em que ela mostra a importância do espaço público para exercício da liberdade humana.


“O mundo – artifício humano – separa a existência do homem de todo ambiente meramente animal; mas a vida, em si, permanece fora desse mundo artificial, e através da vida o homem permanece ligado a todos os outros organismos vivos. Recentemente, a ciência vem-se esforçando por tornar “artificial” a própria vida, por cortar o último laço que faz do próprio homem um filho da natureza.”


“[...] tudo que os homens fazem, sabem ou experimentam só tem sentido na medida em que pode ser discutido.”


“A pluralidade é a condição da ação humana pelo fato de sermos todos os mesmos, isto é, humanos, sem que ninguém seja exatamente igual a qualquer pessoa que tenha existido, exista ou venha a existir.”


“A pobreza força o homem livre a agir como escravo.”


“Uma existência vivida inteiramente em público, na presença de outros, torna-se, como diríamos, superficial.”


“[...] no instante em que uma boa obra se torna pública ou conhecida, perde o seu caráter específico de bondade, de não ter sido feita por outro motivo além do amor à bondade.”


“O amor à sabedoria e o amor à bondade, que se resolvem nas atividades de filosofar e de praticar boas ações, têm em comum o fato de que cessam imeditamente – cancelam-se, por assim dizer – sempre que se presume que o homem pode ser sábio ou ser bom.”


“Só a bondade deve esconder-se de modo absoluto e evitar qualquer publicidade, pois do contrário é destruída.”


“Estar em solidão significa estar consigo mesmo; e, portanto, o ato de pensar, embora possa ser a mais solitária das atividades, nunca é realizado inteiramente sem um parceiro e sem companhia.”


“[...] os pensamentos, como todas as coisas que devem sua existência à memória, podem ser transformados em objetos tangíveis que, como a página escrita ou o livro impresso, se tornam parte do artifício humano. As boas obras, por deverem ser imediatamente esquecidas, jamais podem tornar-se parte do mundo; vêm e vão sem deixar vestígios;e positivamente não pertencem a este mundo.”


“É este caráter extramundano das boas obras que faz do amante da bondade uma figura essencialmente religiosa e torna a bondade, como sabedoria na antiguidade, uma qualidade essencialmente inumana e sobre-humana.”


“Se não tivéssemos outras percepções sensoriais além daquelas nas quais o corpo se percebe a si mesmo, a realidade do mundo exterior não ficaria sujeita à dúvida mas não teríamos sequer noção do que viesse a ser um mundo.”


“A condição humana é tal que a dor e o esforço não são meros sintomas que podem ser eliminados sem que mude a própria vida; antes, são modos pelos quais a própria vida, juntamente com a necessidade à qual está vinculada, se faz sentir. Para os mortais, a “boa vida dos deuses” seria uma vida sem vida.”


“A confiança na realidade da vida, ao contrário, depende quase exclusivamente da intensidade com que a vida é experimentada, do impacto com que ela se faz sentir.”


“[...] num mundo estritamente utilitário, todos os fins tendem a ser de certa duração e transformar-se em meios para outros fins.”


“[...] esta materialização, sem a qual nenhum pensamento pode tornar-se coisa tangível, ocorre sempre a um preço, e que o preço é a própria vida: é sempre na “letra morta” que o “espírito vivo” deve sobreviver [...]”


“[...] a memória e o dom de lembrar, dos quais provém todo desejo de imperecibilidade, necessitam de coisas que os façam recordar, para que eles próprios não venham a perecer.”


“[...] os processos do pensamento permeiam tão intimamente toda a existência humana que o seu começo e o seu fim coincidem com o começo e o fim da própria existência humana.”


“[...] a ação e o discurso são os modos pelos quais os seres humanos se manifestam uns aos outros, não como meros objetos físicos, mas enquanto homens.”


“Embora todos comecem a vida inserindo-se no mundo humano através do discurso e da ação, ninguém é autor ou criador da história de sua própria vida. Em outras palavras, as histórias, resultado da ação e do discurso, revelam um agente, mas esse agente não é autor nem produtor. Alguém a iniciou e dela é o sujeito, na dupla acepção da palavra, mas ninguém é seu autor.”


“A diferença entre história real e a ficção é precisamente que esta última é “feita”, enquanto a primeira não o é.”


“[...] história é uma série de eventos, e não de forças ou idéias de curso previsível.”


“[...] as ideias vêm e vão, duram algum tempo, podem até alcançar certa imortalidade própria, dependendo do seu poder de iluminar e esclarecer, que vive e perdura independentemente do tempo e da história.”


“[...] a morada da alma só pode ser construída com firmeza na sólida fundação do mais completo desespero.”


“[...] a moderna filosofia, desde Descartes, tem consistido na manifestação e nas ramificações da dúvida.”


“Se o Ser e a Aparência estão definitivamente separados – e este, como observou Marx certa vez, é realmente o pressuposto básico de toda ciência moderna – então nada resta que não possa ser aceito de boa fé; tudo deve ser posto em dúvida.”


“[...] se já não podemos confiar nos sentidos, nem no senso comum, nem na razão, então é possível que tudo que julgamos ser realidade não passe de um sonho.”


“Se tudo se tornou duvidoso, então pelo menos a dúvida é certa e real.”


“[...] embora não possa conhecer a verdade como algo dado e revelado, o homem pode, pelo menos, conhecer o que ele próprio faz.”


“[...] quem deseje fazer do prazer o fim último de toda ação humana, é levado a admitir que não o prazer, mas a dor, não o desejo, mas o medo, são os seus verdadeiros guias.”

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