Especial Noel Rosa - O poeta da Vila e a dama do cabaré


Noel Rosa era considerado um “bacharel” em samba e malandragem, mas chorou a dor do amor .


Numa festa de São João no bairro carioca da Lapa, em 23 de junho de 1934, Noel Rosa conheceu uma dama de cabaré que o encantou: Juraci Correia de Moraes. Ceci, como era mais conhecida, era uma adolescente de 16 anos, recém-chegada da cidade serrana de Nova Friburgo. Nessa data em que Noel era homenageado no Cabaré Apolo, Ceci conseguia seu primeiro emprego como dançarina. Começaria aí um dos casos de amor mais líricos da história da canção popular brasileira.

Até então, Noel já havia conquistado a fama com o sucesso “Com que roupa”; posto o país à venda em “Quem dá mais?”; composto emboladas com o Bando dos Tangarás; arriscado sambas anatômicos, como “Coração”, epistolares, como “Cordiais saudações”, e fonéticos, como “Picilone”. Noel declarava todo o seu amor ao “feitiço sem farofa” de Vila Isabel, envolvia-se em polêmicas com Wilson Batista sobre a malandragem e o valor do sambista, e andava pelos morros do Estácio, Salgueiro, Mangueira e Matriz na companhia de Cartola, Bide, Canuto, Ismael Silva, Heitor dos Prazeres.

Noel cantou os bêbados, os maltrapilhos, os maltratados, a boemia, a cidade, a noite, a modernidade, os acertos e os desmazelos do Brasil. Cantou de forma crítica, irreverente, satírica, bem-humorada. Debochado, zombou da tragédia alheia e também da sua própria. Afinal, era um homem comum, como todos os seus personagens. Por essa razão, suas canções eram ouvidas no cinema, no carnaval, no rádio e no teatro. O “bacharel” da Vila não precisou de diploma de colégio para desvendar o mistério do samba. Segundo Noel, o samba “não vem do morro nem da cidade”. (...)

Noel Rosa propõe uma nova atitude diante da canção popular e do amor. Sem prosopopeias ele canta os sentimentos vividos, e não sonhados...

Na noite em que saiu para comemorar seu aniversário, compôs ironicamente, em forma de testamento, ao pé da cama da musa (Ceci), seu "último desejo", canção que anunciava o fim do romance.

Último Desejo 

Composição: Noel Rosa
 
Nosso amor que eu não esqueço, e que teve o
seu começo
Numa festa de São João
Morre hoje sem foguete, sem retrato e sem bilhete,
sem luar, sem violão
Perto de você me calo, tudo penso e nada falo
Tenho medo de chorar
Nunca mais quero o seu beijo mas meu último desejo
você não pode negar
Se alguma pessoa amiga pedir que você
lhe diga
Se você me quer ou não, diga que você
me adora
Que você lamenta e chora a nossa separação
Às pessoas que eu detesto, diga sempre que eu não
presto
Que meu lar é o botequim, que eu arruinei sua vida
Que eu não mereço a comida que você pagou pra mim





Leia mais in Revista de História da Biblioteca Nacional, ano 6, nº 63, dezembro 2010, p. 75-80.

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