Mariana, celebra hoje seus 315 anos com o desafio de preservar patrimônio histórico

Arquivo EM/D.A. Press - 05/12/84
Igreja de Nossa Senhora da Assunção, elevada a Catedral da Sé e a sede de bispado em 1745, foi concluída em 1750 e teve órgão doado pelo rei


Hoje, quando a capital do estado for simbolicamente transferida para Mariana, em comemoração ao Dia de Minas Gerais, uma história de exatos 315 anos virá à tona. O evento joga luz sobre o pioneirismo do município da Região Central que carrega a marca de ser, para os mineiros, a primeira vila, primeira capital, primeira cidade projetada e sede do primeiro bispado. Nascida nos tempos da descoberta do ouro, a antiga Vila de Nossa Senhora do Ribeirão do Carmo amadureceu sob a cobiça dos bandeirantes, foi palco de memoráveis disputas de poder – como a Guerra dos Emboabas, nos idos de 1700 – e se consolidou como tesouro barroco, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Guardiã de riquezas que remetem aos tempos do Brasil colônia, a cidade do século 21 enfrenta agora desafios para preservar a imponente arquitetura e superar problemas de infraestrutura urbana.

Reluzentes pepitas de ouro encontradas num ribeirão, em 16 de julho de 1696 – Dia de Nossa Senhora do Carmo –, por bandeirantes paulistas são o ponto de partida dessa história. Chefiados por Salvador Fernandes Furtado de Mendonça, os homens que partiram da Capitania de São Paulo em busca de riqueza fundaram ali, às margens do curso d’água, o arraial batizado com o nome da santa. Pouco anos depois, ao lado do vizinho arraial de Tripuí (mais tarde Vila Rica e, hoje, Ouro Preto), o povoado assumiu a função estratégica no jogo de poder determinado pelo ouro. Com uma população que, somados os dois arraiais, superava a de todo o Brasil, a região passou a ser vista com ressalvas pela Coroa, que, sem autoridades constituídas no local, tinha dificuldades de controlar a ordem e extração de metais.




O cenário de disputas pelo ouro e pelo poder culminou com a Guerra dos Emboabas. Os paulistas, descobridores das minas, se viram ameaçados por um grupo formado por portugueses, baianos e pernambucanos apelidados emboabas (ou também reinóis e forasteiros), que chegaram em massa, invadindo a área e revoltando os pioneiros. O conflito, que foi acima de tudo político, em torno dos principais cargos e postos da administração, levou a embates armados e à escolha, em 1707, do emboaba Nunes Viana para governador, à revelia da Coroa. Para apaziguar os ânimos e retomar o controle da região, a Corte enviou a Minas, em 1709, o português Antônio de Albuquerque.

Em 8 de abril de 1711, o administrador colonial eleva o arraial à condição de vila, batizada de Nossa Senhora do Ribeirão do Carmo de Albuquerque. Primeira vila da então Capitania de São Paulo e Minas de Ouro, lá foi estabelecida também a primeira capital. Em 4 de julho do mesmo ano, a Câmara é instituída na Praça de Minas, em frente às igrejas de São Francisco e do Carmo, onde ocorrer as primeiras eleições. Em 1745, por ordem do rei de Portugal dom João V, a região se transforma em cidade e é nomeada Mariana, em homenagem à rainha Maria Ana D’Austria, mulher dele. No mesmo ano, o rei lusitano pede ao papa Bento XIV a criação da Diocese de Mariana, sendo nomeado o bispo dom Frei Manoel da Cruz.

Impulsionada pelos ares do desenvolvimento, Mariana ganha um projeto urbanístico e passa a ser a primeira cidade projetada de Minas. O engenheiro militar José Fernandes Pinto de Alpoim e o construtor José Pereira Arouca fazem o traçado do que hoje é o Centro Histórico. “A então vila de Mariana ficou num cantinho da região, atualmente ocupado pelo Bairro Santo Antônio. O rei mandou traçar ruas em linha reta e praças retangulares, características marcantes da cidade, e ordenou a construção da catedral”, explica o presidente da Casa de Cultura e da Academia Marianense de Letras e diretor-executivo da Fundação Cultural da Arquidiocese de Mariana, Roque Camêllo.

A Igreja de Nossa Senhora da Assunção, a Catedral Basílica da Sé, foi inaugurada em 1750 e um dos presentes do rei à cidade foi a doação do órgão alemão Arp Schnitger. Instalado por ninguém menos que Manuel Francisco Lisboa, o pai de Aleijadinho, o instrumento até hoje é executado aos domingos. A trajetória religiosa de Mariana segue com a criação do seminário, por volta de 1750, e do Palácio dos Bispos. Este último escreve um capitulo à parte na história da cidade. Famoso por ter o mais belo jardim mineiro do século 18, admirado até pelo botânico e viajante francês Auguste de Saint-Hilaire, o palácio era dono da fonte Samaritana, esculpida por Aleijadinho em pedra-sabão (hoje parte do acervo do Museu de Arte Sacra) e recebeu a visita de Dom Pedro II, em 1881, durante os festejos da Semana Santa.

Esplendor e riqueza continuaram a fazer parte da história de Mariana nas décadas seguintes até que, em 1938, o conjunto arquitetônico e urbanístico foi tombado pelo Iphan. Hoje, 22 edificações também contam com o tombamento isolado do órgão. Mas o ato administrativo não significa o fim da ameaça à descaracterização da arquitetura dos séculos 18 e 19 e, muito menos, a solução dos problemas de infraestrutura urbana. Com uma população de 54 mil habitantes, Mariana sofre para se manter como joia do barroco.

Depois de um período político problemático, com quatro prefeitos desde 2008, Mariana vive dias mais tranquilos e, em 2011, festeja 315 anos de história e 300 anos como Vila do Ouro. “Além do desafio de preservar o patrimônio e conter o crescimento populacional, enfrentamos o dilema da mineração. A atividade é o alicerce da economia municipal, mas a compensação financeira pela extração do minério não ameniza os danos ambientais”, conclui Roque Camêllo, ex-prefeito da cidade.

VILAS DO OURO
Beto Novaes/EM/D.A. Press - 14/01/11
Três cidades mineiras festejam, este ano, 300 anos de elevação a vila. Mariana e Ouro Preto, na Região Central, celebraram a data em 8 de abril e 8 de julho, respectivamente. Amanhã, será a vez de Sabará, na Grande BH, comemorar um ciclo cujas raízes estão nos primórdios da colonização e passam pela lenda da Serra de Prata do Sabarabuçu, que atraiu aventureiros para o sertão em busca de riquezas. Considerado um dos primeiros povoamentos de Minas, Sabará teria surgido em 1674, quando a bandeira de Fernão Dias Paes Leme chegou à região, mais precisamente em Roça Grande. A cidade guarda, para este domingo, as principais atrações. Missa campal, na Praça Melo Viana, vai abrir as celebrações que seguem com o lançamento de selo comemorativo, de exposições e apresentações culturais. A programação se estende até junho 2012 e os visitantes também podem conferir as belezas do seu patrimônio histórico (foto).

Nossa história
LINHA DO TEMPO
 
1696

Em 16 de julho, bandeirantes paulistas encontram ouro no Ribeirão Nossa Senhora do Carmo, onde nasce o arraial.


1711

Em 8 de abril, é elevada à condição de vila, batizada de Nossa Senhora do Ribeirão do Carmo de Albuquerque. Primeira vila da então Capitania de São Paulo e Minas de Ouro, foi também estabelecida como a primeira capital.
Em 4 de julho é instituída a Câmara, na Praça Minas Gerais, em frente às igrejas de São Francisco e do Carmo.

1745

Por ordem do rei de Portugal dom João V, a região é elevada a cidade e nomeada Mariana – uma homenagem à rainha Maria
Ana D’Austria, sua mulher.

1745

O papa Bento XIV cria, em bula papal, a Diocese de Mariana, a primeira do estado. Dom Frei Manoel da Cruz é enviado do Maranhão para ser o bispo.

1750

Inauguração da Igreja Nossa Senhora da Assunção, a Catedral Basílica da Sé. Entre os principais artífices está Manuel Francisco Lisboa, o pai de Aleijadinho, que instalou o órgão alemão Arp Schnitger, até hoje executado aos domingos.

1822

Em abril, dom Pedro I visita Mariana para pacificar rebeliões na província de Minas.

1881

Dom Pedro II, então imperador do Brasil, chega a Mariana durante os festejos da semana santa. Junto com a imperatriz Teresa Cristina de Bourbon, ele se hospeda no Palácio dos Bispos.

1938

Em 14 de maio, o conjunto urbanístico de Mariana é tombado pelo Iphan.

1996

Centro Histórico de Santa Rita Durão, distrito de Mariana, é tombado pelo Iepha.

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