Ponte Nova prepara para receber D. José Maria Pires - Dom Zumbi
Ponte Nova prepara para receber D. José Maria Pires, bispo emérito de João Pessoa, homem que traz na história, de forma revolucionária os cinquenta anos do Concílio Vaticano II! Razão da sua vinda é o lançamento do livro UM PROFETA EM MOVIMENTO, do padre Mauro Passos, na noite do dia dezessete de novembro, no Centro de Pastoral em Palmeiras.
Quem nunca ouviu falar em dom Zumbi ou dom Pelé, bispo negro, responsável pela homilia da MISSA DOS QUILOMBOS?
“Houvesse a Igreja da época marcado presença mais na senzala do que na casa grande, mais nos quilombos do que nas cortes, outros teriam sido os rumos da história no Brasil (...), outra teria sido a contribuição do negro ao nosso desenvolvimento.”
Com um cortejo de aproximadamente cinco bandas de congadeiros, desceremos do bairro Fátima até Palmeiras, num cortejo mais que afrodescendente para celebrar a partir do Gangazumba, Herdeiros do Banzo, Zimbabwe e Fundação Menino Jesus, a graça de ter um Profeta entre nós, informa o pároco, padre José Luiz da Silva.
Dom Helder Câmara e dom José Maria Pires:
irmãos de fé que deixaram exemplos de compromisso social e amor ao próximo
Dom José Maria Pires encarna a presença da Igreja na história. Ele marca o profetismo com o colorido mineiro, o diálogo e a sensibilidade em face do humano. Diálogo é sua marca registrada.
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Sua trajetória, a partir do Concílio, foi uma caminhada em busca da raiz das coisas fundamentadas no Evangelho e na melhor reflexão teológica do século 20. Assumiu ainda com alegria a realidade de sua negritude e aprofundou com coragem a aproximação da liturgia da Igreja com a liturgia dos afrodescendentes. Sua Missa Conga é de extraordinária beleza e de grande simbologia mística. Foi o primeiro bispo brasileiro a assumir sua negritude. Segundo o sociólogo Pedro A. Ribeiro de Oliveira: “Certa vez, numa reunião com bispos, ele contou que ao iniciar a missa, rezou: “Em nome de Olorum, de Oxalá e de Ifá”. A assembleia respondeu: “Axé”. Diante do ar de desaprovação dos colegas, justificou-se: “Se eu posso invocar a Trindade em português, latim e grego, por que não em língua nagô?” E deu uma risadinha marota como para sinalizar que conhecia muito bem o real significado daquele gesto.
O Nordeste o recebeu o irmão e parceiro de dom Hélder Câmara em 1966, como arcebispo da Paraíba. Em João Pessoa, como em Araçuaí, dom José tomou o partido dos pobres, dos despossuídos, e de modo especial assumiu uma liderança na cultura popular. Assim, foi aprofundando sua relação com os últimos deste país e os perseguidos no período da ditadura militar. Teve iniciativas ousadas, como a criação do primeiro Centro de Defesa dos Direitos Humanos do Brasil, em João Pessoa, uma iniciativa que o projetou a um nível latino-americano. Ele se torna responsável pelo setor social do Conselho Episcopal Latino-Americano (Celam).
Em 1981, ele publica pela Editora Vozes um livro com o título: Do centro para a margem. Um título que demonstra como dom José sempre mais, “rompe o casulo eclesiástico e vê na sua função hierárquica um trampolim que possibilita o mergulho em questões relativas à vida na sociedade como um todo”, segundo o historiador Eduardo Hoornaert. No dizer de José Comblin, é esse tipo de bispo que o terceiro milênio vem solicitar: “Doravante, o lugar do bispo é o mundo. Ele encarna a presença da igreja no meio do mundo. É homem de relações públicas, é a visibilidade da igreja”.
Um sinal disso é a Missa dos Quilombos (1981) que ele celebra em Recife com dom Pedro Casaldáliga na frente da Igreja do Carmo, na qual a cabeça de Zumbi fora exposta séculos atrás. É uma missa de dimensões antes societárias que eclesiásticas. Os sons dos tambores sinalizam um compromisso societário com o segmento negro da população. E a partir deste momento dom Pedro Casaldáliga chama o arcebispo da Paraíba de “dom Zumbi”, uma palavra bem mais carregada de simbolismo que o de “dom Pelé” que lhe foi atribuído por dom Hélder.
A pessoa de dom José Maria está sempre associada à de dom Hélder. Os dois combinavam muito bem. Eram muito diferentes: o negro, muito mais calmo e introvertido, o branco muito mais extrovertido e expansivo. Estavam intimamente unidos porque se identificavam com a mesma causa, com o mesmo povo, a mesma esperança e as mesmas lutas. Juntos, enfrentaram as mesmas resistências, lutas e problemas.
Pastor presente
Quando chegou à Paraíba, deparou-se imediatamente com os problemas agrários. Aceitou com responsabilidade o desafio. Sempre esteve em primeira linha em todos os conflitos da terra. Grande foi o conflito de Alagamar. Um fato singular nesta história foi a ida de dom José Maria Pires, àquela região, para expulsar o gado das plantações dos camponeses. Ao seu lado estavam dom Hélder Câmara, outros bispos e religiosos que, também, ajudaram a tocar os animais para que não comessem a lavoura, a mando dos próprios donos de terras. Sempre esteve presente nestes conflitos e a presença dele era uma proteção e uma garantia para os camponeses.
Pela sua palavra e pela sua intervenção junto às autoridades, impediu que houvesse violências maiores no campo. Quando aparecia um conflito, dom José era o primeiro a chegar. Não fugia da sua responsabilidade de pastor. Não invocava pretextos para ficar na cúria diocesana, como fazem outros. Respondia imediatamente ao apelo quando percebia que a sua responsabilidade de pastor estava desafiada. Sempre guardou a ousadia e coragem dos profetas.
As iniciativas plantaram raízes bem profundas. Destaco na linha da educação, a criação de bibliotecas populares com o seguinte slogan: “Dê um livro e espalhe sabedoria”. Isso demonstra uma alteração significativa do trabalho religioso. Contribuir para com a cultura do povo, escolhendo métodos e instrumentos adequados.
Um aspecto importante no trabalho popular é impulsionar os grupos para as diversas atividades O povo é a força de mudança, por isso, deve ter acesso aos bens culturais, adquirir confiança nos trabalhos e enfrentar os conflitos e problemas. Um trabalho popular é também uma proposta provisória a ser tentada e definida pela reflexão, experiência e prática.
Opção pelos pobres
O grande passo que a arquidiocese da Paraíba deu no período de dom José foi a mudança de seu lugar social. De uma igreja ligada às classes privilegiadas para uma igreja que, a partir dos pobres, foi-se esforçando em prol de uma evangelização em crescente nível de participação e comunhão. A arquidiocese assumiu uma opção singular – a opção pelos pobres.
Para todos, ele serve o vinho de sua simplicidade, cordialidade, simpatia. Entretempo, não deixa de cutucar de vez em quando a estrutura eclesiástica com palavras incisivas: “A igreja será fiel ao evangelho quando for além da opção pelos pobres”. Neste tempo em que nossa sociedade parece sujeita a um déficit de sentido e valores, visualizamos um horizonte de vida possuído de testemunho e portador de significados e sentidos. Sua história revela outra face – a crítica ao catolicismo atual e o desejo de que o presente e o futuro devolvam as sementes perdidas/guardadas.
Um profeta em movimento – Dom José Maria Pires desatando nós Organizado por Mauro Passos Lançamento dia 17 no centro Pastoral de Palmeiras - Ponte Nova - MG após a Missa Conga às 19 horas.
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