As idades do cérebro


Pode ir se preparando: nossa organização cerebral passa por reformas periódicas ao longo dos anos. E cada região do córtex envelhece num ritmo diferente
Salvador Nogueira
É um dos chavões mais comuns, ao ver algum velhinho serelepe saltitando pelas pradarias, dizer que "a idade está na cabeça". De fato, para muitas coisas importantes na vida, isso é a mais absoluta verdade. Mas o diabo está nos detalhes: os últimos avanços da neurociência estão demonstrando não só que cada etapa da vida é marcada por uma configuração cerebral diferente, mas também, e mais surpreendente ainda, que partes distintas do cérebro têm ritmos de amadurecimento diferentes. Pois é, foi-se o tempo em que esse órgão (tido pelos antigos egípcios como "sem utilidade", o único que era simplesmente jogado no lixo durante o processo de mumificação) era uma caixa-preta impenetrável, imune às investidas dos cientistas. Hoje, uma das coisas que estão mais claras a respeito do cérebro é que, em uma gama muito ampla de casos, ele não pode ser tratado como uma coisa só, mas como um arranjo de vários "departamentos" diferentes, que existem em regiões diferentes do cérebro.
Por muito tempo, foi difícil identificar como ocorria a evolução do cérebro ao longo da vida - que não se dirá de partes específicas dele? Um dos maiores mistérios é que, a despeito de o órgão crescer bastante desde o nascimento até a idade adulta (o cérebro de um recém-nascido tem apenas um terço de seu porte final), suas principais unidades - os neurônios - mantêm-se mais ou menos na mesma quantidade ao longo dos anos.
Isso não quer dizer, como por muito tempo se acreditou, que o cérebro já nasça com todos os neurônios que terá até o fim da vida - hoje sabe-se que, pelo menos em algumas regiões cerebrais, essas células nervosas estão o tempo todo sendo criadas e reabastecidas, para suprir a perda de unidades mais antigas. O cérebro, pelo menos enquanto está saudável, possui uma capacidade de "manutenção". Mas o ponto é que o número total de neurônios é aproximadamente o mesmo pela maior parte da vida.
A alta produção de sinapses vai até a adolescência. a idéia de que os bebês vivem uma "Idade mágica" até os 3 anos é uma lenda
Mas, então, o que muda, além do tamanho? A fronteira atual da neurociência, cada vez mais avançada por conta dos sucessos recentes no desenvolvimento de técnicas não-invasivas de estudo do cérebro, mostra que é possível dividir a vida cerebral em várias etapas: a fase infantil, que dura mais ou menos até os 12 anos, a fase do cérebro adolescente, a fase adulta e uma ligada à terceira idade.
O cérebro infantil, como todo mundo que convive com criança pequena sabe, é incansável. Tudo é motivo para alegria ou tristeza, as emoções afloram com facilidade e, de uma forma geral, a capacidade racional é ofuscada pela confusão e por uma profusão de sensações diferentes. Não é à toa. Embora a genética e o desenvolvimento já forneçam um padrão de organização para o cérebro, com regiões diferentes servindo a propósitos diferentes, elas ainda não tiveram tempo e experiências suficientes para se fixarem no cérebro. Isso equivale a dizer que, nesse ponto do tempo, o córtex da criança (região mais externa do cérebro, responsável pelas funções cognitivas) é praticamente um livro aberto.

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